sábado

Bruna - 1

Bruna olhava pela janela do Stalos. Um dos poucos lugares abertos em Copacabana na madrugada. Chovia lá fora e passava das quatro da manhã - quando se instaura uma espécie de vácuo temporal, que dura exatamente o necessário para a realização completa de um ato a ser interrompido.

Vamos olhar para ela. Recém saída da universidade. Sem trabalho fixo. Envolvida em um projeto musical de certo sucesso. Sua banda pratica um misto de rock minimalista com fortes componentes de ambient. Ela gosta de comparar o som, com reservas, ao Cocteau Twins.

O rosto quase alemão da Bruna - traços mais retangulares que redondos - contrastava com sua estatura de um metro e 50 e oito-nove. Na adolescência, essa particularidade a deixava irritada. Com o passar do tempo, porém, começou a notar as linhas mais bruscas se configurando num arrebate.

Ela olhava para o movimento das árvores por trás do vidro e pensava se iria recordar deste momento. Como será a recordação? Quando?

O próprio mecanismo das recordações a incomodava pela imprecisão há muito mais tempo (e frequência), do que as memórias propriamente ditas, incomodamente esparsas.

Muitas vezes imaginava a memória como uma ilusão. Outras, como reconhecimento de padrões. Ou seja, algo voltado para auto-aprendizado. Para a capacidade de reconhecer algo já visto. Ou, de modo mais simples, como um jogo de adestramento do olhar. Do treinamento dos olhos. A memória seria um saber do reconhecimento.

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